Diretório Estadual do Rio Grande do Sul

MOVIMENTOS SOCIAIS ÁGEIS E PARTIDOS POLÍTICOS LENTOS

Autor: Eloí Flôres da Silva

Para o Movimento Autenticidade Trabalhista

Texto preparado para o 5º Congresso Nacional do PDT

Porto Alegre, julho de 2013.

 

POSICIONAMENTO

 

As redes sociais livremente organizadas, presentes em todos os continentes, se movimentam com agilidade superior às estruturas cristalizadas da sociedade civil organizada do passado recente. As atuais ferramentas das tecnologias de informação - twitter, facebook, e-mail, Youtube – estão se mostrando mais ágeis e eficientes do que as estruturas orgânicas dos partidos, sindicatos e governos, na captação e interpretação do pensamento e desejos da população.

Da mobilização nacional, sem dúvida, poderão surgir novas lideranças capazes de ladear e até enfrentar qualquer tipo de iniciativa das organizações sindicais e dos partidos, na expectativa de criar um novo sistema representativo digno – moral e ético - capaz de combater a corrupção e a impunidade, os serviços ineficientes e o gasto público; temas levantados pelo movimento. 

Admite-se que exista a desconfiança da juventude e de parte da sociedade em relação ao poder político que respalda a governança e, ao executivo com sua postura autocrática, quanto à possibilidade de que possam promover as mudanças que o Brasil necessita. Destaque-se a título de lembrança que a aprovação das leis de Responsabilidade Fiscal, de Acesso à Informação Pública e a Ficha Limpa somente ocorreu por iniciativa popular e, ainda dorme no Congresso Nacional o projeto de lei que elimina o Fator Previdenciário que acabaria com o sangramento nas aposentadorias de milhões de idosos.

A sociedade moderna, agilmente, vê na política o meio pelo qual a sociedade resolve os conflitos de interesse socioeconômico. Entretanto, é através dos partidos políticos e não pela eliminação deles, que se resolvem os grandes conflitos, pois sem estes, sobram à prepotência, resta apenas à influência dos capitais financeiros ou então a força de estado. Em vez do protesto anárquico, o partido político é o instrumento que a sociedade moderna dispõe para que a representação popular seja efetiva e duradoura. Então, o tema reforma política tem que estar na pauta dos debates para que se defina o caminho que a sociedade quer seguir.

Parece que a sociedade brasileira acomodou-se fazendo ouvidos moucos aos discursos dos partidos políticos enquanto representação da pressão popular sobre os “donos do poder” (Faoro, Raimundo, 1958). Esqueceu em parte que os partidos políticos a sustentam - orientando as demandas da cidadania, os direitos e as necessidades econômicas e sociais. Tinha-se a impressão que a sociedade estava satisfeita com suas formas de representação social e com o que fluía na economia e com os serviços públicos oferecidos. De repente surgem os “vândalos”.

Utilizando-se do suposto direito de depredar, revelam a falta de valores nas práticas políticas de uma sociedade democrática, à medida que passam a atingir patrimônios públicos e privados em sua vontade de protestar contra tudo que represente poder político, poder de estado, poder econômico. Ignoram com esses atos a representação partidária e, também, revelam que não percebem o significado de a história de uma cidade ou de uma capital, e pouca atenção talvez dispensem ao significado das palavras liberdade e democracia.

A aproximação da juventude idealista e não dos seus “vândalos infiltrados” seria essencial na formação das organizações (núcleos de base) que compõem o PDT junto às lideranças que sustentam o Movimento junho 2013. Essa aproximação é desejável, pela vitalidade e entusiasmo que os jovens contêm. Não se pode perder essa energia, a esperança que seus protestos representam para um país melhor e mais democrático. Inicialmente centrada na questão do Movimento Passe Livre, relativa ao transporte urbano, o ímpeto dessa juventude trabalhista poderia levar a novas propostas políticas.

O passe livre é desejável, sim.  A quem será estendido o benefício? A toda a população de jovens estudantes? Que áreas (municípios) ou regiões (metropolitanas) serão contempladas? Como definir as fontes de recursos e o processo de justiça na distribuição do benefício? Que tipo de relação se estabelecerá entre o Estado e o setor privado do transporte coletivo urbano para dar suporte à iniciativa?

Deve haver essa reflexão antes de se adotar a proposta desejada apelo Movimento Passe Livre porque, afinal, vivemos sob os auspícios de uma sociedade democrática e de autonomia de mercado. Enquanto o que se coloca acima não for resolvido em seu todo, a proposta, em longo prazo, se apresenta como inviável do ponto de vista econômico para as prefeituras e, politicamente desviada dos seus objetivos sociais, na medida em que não beneficia a todos os usuários.

Ao sobrecarregar transportadores e outros contribuintes, estaria estabelecendo um novo tipo de privilégio. Então, recomenda-se que o caminho a ser tomado em curto prazo seja o da construção do entendimento entre Governos Federal, Estaduais e Municipais. Assim, todos os tributos que incidem sobre o transporte coletivo serão eliminados, beneficiando também a classe trabalhadora e os estudantes mais pobres que ainda não gozam do passe livre. Outro fator a ser considerado é a preservação das empresas de transportes coletivos urbanos que atuam por contratos juridicamente perfeitos – via processos licitatórios - que terá de ser recomposto no acerto.

Retirar a pressão do estado autocrático atual, em relação aos estados e municípios. Sim isso também é necessário. Construir um novo modelo de diálogo político que tenha como tema a distribuição de recursos gerados na economia entre os entes do real Estado Federativo, reconstituindo o que se poderia chamar de gestão solidária de efeito republicano. A apropriação pelo governo federal das receitas geradas pelos municípios, e o aumento de encargos e serviços transferidos a estes chegou a um novo ponto do esgotamento. É bom lembrar que a Revolução Farroupilha de 1835 já havia sido desencadeada por tributação excessiva. Talvez, o exaurimento dos estados seja o fator que mais contribui para a má qualidade dos serviços públicos prestados à população. Cite-se, a população vive no município. Se este não funciona gerencialmente bem, vem à insatisfação com o todo.

 

O 5º Congresso Nacional do PDT

O “Movimento junho 2013” que surge aparentemente do nada, tem algo de bom em suas entranhas: está colocando agilidade e definindo pautas havia muito tempo encalhadas no Congresso Nacional, nos Tribunais de Justiça e nos órgãos de fiscalização do estado brasileiro.

Propostas aceitas, precipitadamente, como salvadoras da situação e sucedidas pelo imediato recuo devido à inviabilidade prática que propõem, já foram discutidas no poder executivo e tendem a enfraquecer o poder central. Desastradamente, somam-se a esses enganos deslizes inexplicáveis de líderes oportunistas do Congresso Nacional que participam da base de sustentação da política do governo federal. Como acreditar na dignidade dos legisladores e proponentes? Como ter esperança que as mudanças sugeridas realmente atendam as reivindicações originais? Que força grupal terá um partido que compõe a base de governo para levar, debater e aprovar propostas que alterem as insatisfações das massas populares?

O poeta baiano, Antônio Frederico de Castro Alves (1847-1871) firmando sua indignação para com os grandes problemas sociais de seu tempo, sentenciou:

“A praça é do povo, como o céu é do condor ... Senhor, pois quereis a praça? Desgraçada a população! Só tem a rua de seu ... Da plebe doem-se os membros, No chicote do poder, E o momento é malfadado, Quando o povo ensanguentado, Diz: já não posso sofrer”.

 

A rua, a praça, os acessos públicos sempre foram para o trabalhismo o espaço do povo e de sua prática política. A propósito dos movimentos de rua da juventude, das organizações sindicais e dos partidos políticos, é importante registrar-se que a Executiva Nacional do PDT, em sua decisão do dia 15 de maio de 2013, encaminhou como uma antevisão do momento atual da política brasileira, aos trabalhistas do Brasil, a relação dos Eixos e Temas que nortearão os debates e as votações da 2ª fase do 5º Congresso Nacional, marcado para os dias 23 e 24 de agosto de 2013, em Brasília-DF. O rol de temas e de desafios apresenta sintonia com as reivindicações que os manifestantes colocam nas ruas das cidades do país e também nas agremiações partidárias. Trata-se de um momento de profunda reflexão e compreensão sobre sintomas sociais revelados pela sociedade brasileira.

É oportuno expor em síntese a visão do trabalhismo sobre esse momento histórico, sobre o qual se debruça a sociedade brasileira para pensar e exaltar a existência de um extremado abuso do poder central em relação aos estados e municípios da federação que, penam com a falta de recursos financeiros e humanos para o desempenho de suas obrigações com a população no tocante a saúde, a educação, a segurança, o saneamento básico, direitos trabalhistas, enquanto o poder central esbanja, quando não coloca na lata de lixo bilhões de reais por incompetência na execução de obras e compra de ativos privados. A gestão social funciona bem quando possui canais e estruturas orgânicas ativas permeando todos os segmentos da sociedade e cumprindo com o papel desejado de conduzir a boa administração dos recursos públicos. Mas, há também, um contrassenso que põe em risco a boa gestão social. É quando o poder político não está em sintonia com a luta da sociedade que o sustenta.

Diante dos confrontos e das reivindicações dos movimentos de ruas e praças - das organizações sindicais e movimentos espontâneos - poder-se-ia propor um encaminhamento de várias ações propositivas, de tal sorte a contribuir para a organização de uma linha de atuação coerente e duradoura para o PDT. A direção do partido deveria cerrar fileiras na defesa da reestruturação econômica e financeira da nação e na reforma política para preservar a livre iniciativa do nosso povo.

O crescimento da economia brasileira baseada no consumo interno começa a dar mostra de enfraquecimento e já se admite um PIB próximo ao de 2012, de 1,5%. O mercado externo, caso venha a se acomodar de forma desfavorável, colocará à economia brasileira frente a severos enfrentamentos com a taxa de emprego e com a redução da poupança para produzir novos investimentos. O PDT, partido que sempre esteve ao lado do trabalhador, do aposentado e do pequeno empreendedor do meio rural e urbano, tem neste momento, uma excelente oportunidade para se manifestar por meio de sua juventude trabalhista. Neste turbulento período, nossos ativos núcleos de base deveriam estar fazendo um trabalho conjunto com os jovens na rua com a perspectiva de estruturar objetivos comuns que possuam aderência com outros temas há muito debatidos pela sociedade brasileira e, na atualidade, denunciados no “Movimento junho 2013”.

 

A ação (des) organizada do movimento político de junho

O movimento iniciado em junho de 2013 atropelou, de forma ordenada ou não, as instituições tradicionais estabelecidas há décadas – partidos, sindicatos, federações patronais, federações de trabalhadores, organizações estudantis – reunindo aspirações e se legitimando como um fenômeno social. Essas manifestações populares são movimentos legítimos que podem, caso não ocorram às respostas às suas reivindicações, se tornarem fora de controle por influência de baderneiros infiltrados. Mais do que nunca se torna necessário criar mecanismos de diálogo entre os representantes da população, partidos políticos e o poder de estado. Visivelmente, este é um momento de risco para a democracia brasileira. A atenção dos partidos políticos está sendo direcionada para valorizar os temas postos na rua. É hora de se dedicar tempo para o estudo da situação. Será somente um retrocesso da democracia brasileira, recentemente consolidada, ou uma reversão à anarquia?

A ganância do oligopólio, do capital internacional e seu poder de convencimento através da mídia e da corrupção que permeia a gestão do Estado, podem ser altamente deletérios ao nosso desenvolvimento político. O desmantelamento das estruturas de fiscalização, do ordenamento jurídico, da organização política, cava espaço para subordinar os mecanismos de arrecadação a interesses espúrios.  Além disso, elevam as dívidas públicas que, por sua vez, alimentam elevadas taxas de juros, as quais todos somos obrigados a pagar.

Os serviços públicos mínguam nesta condição de endividamento – nação, estados e municípios da federação. Estes são fatores invisíveis à população que promovem os movimentos de rua. Esses movimentos são ampliados por uma mídia de direita e encobrem movimentos fascistas que aguardam o instante certo, utilizando a massa como elemento de manobra, para avançarem com suas propostas. A principal delas é derrubar a presidenta eleita, assim como no passado derrubaram o presidente João Goulart. O movimento iniciado em Porto Alegre com seu tema central, o valor da passagem dos transportes coletivos, responde a uma demanda emocional estimulada pela mídia impressa e televisa. Seus desdobramentos foram se despregando de reivindicações específicas e migrando para formas generalizadas de protestos atingindo indiscriminadamente ao governo federal, o estadual e o municipal.

Ao mesmo tempo em que esconde os objetivos da direita, a mídia distorce a verdade sobre as dificuldades que o estado brasileiro enfrenta com essa nefasta ação do oligopólio e do capital internacional que enfraquece via juros indevidos a poupança nacional, impedindo o adequado investimento na modernização dos serviços públicos oferecidos à população. Este processo escuso e que não está posto no debate nas redes sociais e nos meios de comunicação ao alcance do povo, além de agir sobre a cidadania debilitando-a, também não contribui em nada para a formação da capacitação política. Enfim, dissimula a razão das chamadas ineficiências gerenciais dos governos federal, estaduais e municipais e, engana a população, acenando com ideais sociais que virtualmente são inalcançáveis.

O Movimento junho 2013 evidencia a inexistência de mecanismos de conexão entre o povo e o poder. Não há liderança e não há bandeiras. Coloca para o mundo que a tomada de decisão do poder central e do poder político está irremediavelmente dissociada da população, o que é em grande parte mentira. A reformulação desse modelo e das atitudes de quem comanda, precisa abranger todas as organizações da sociedade civil. É um bom alerta.

O professor de jornalismo Eugênio Bucci (ZH, 23.06.2013) avaliando o movimento no país declara: “Essas manifestações não têm carro de som, não têm palanque, não têm unificação de discursos e não têm, sequer, uma liderança formal. É uma confluência de insatisfeitos de várias colorações ideológicas, que vão de seitas de esquerdismo primitivo até falanges de inspiração fascista, todos marchando juntos”.

As manifestações dos jovens do “Movimento junho 2013” podem dar a direção do PDT à abertura de um espaço participativo que contaria com o ingresso de um novo contingente de jovens políticos da geração atual que, se assim ocorrer, sem dúvida, fortalecerá o projeto democrático brasileiro e fortalecerá o modelo político-econômico adotado nas gestões Lula/Dilma. Caberá ao poder central e ao parlamento conduzir as negociações e estabelecer uma relação de confiança entre Estado e Povo para o futuro do país. Surgem, entretanto, questões inquietantes:

A construção da governança e a representação política da sociedade estão afetadas pela falta de canais de diálogos transparentes?

Que iniciativas, que estratégias os partidos que compõem a base de sustentação do governo, devem construir?

Como melhorar a qualidade de vida dos brasileiros?

A movimentação está tendo origem na periferia que sofre com a péssima qualidade dos serviços públicos, com a precária condição do transporte coletivo e com a ameaça da volta da inflação. Tudo isso somado gera um caldo de insatisfação das classes menos favorecidas, recentemente incorporadas aos mercados de consumo.

Uma lição política à sociedade brasileira

Estado, mídia, pensadores, universidades, partidos políticos, lideranças políticas mediante os episódios das manifestações estourando em todo o país, demonstram certa perplexidade frente ao fenômeno social que inusitadamente se apresenta à sociedade. Inicia-se a leitura do fenômeno de massa pelos R$ 0,20 dos transportes nos principais centros urbanos. Evolui-se para os gastos dos estádios da Copa 2014 e progride-se para o tema da corrupção – “Esta mensagem direta das ruas é de repúdio à corrupção e ao uso indevido de dinheiro público (Dilma Rousseff)”.

Ao passar dos dias, torna-se óbvio que a sociedade brasileira está diante de várias dificuldades, mas uma delas se sobrepõe as demais: a incapacidade gerencial dos governos e a ineficiência geral das instâncias republicanos - executivo, legislativo, judiciário - de encontrarem soluções que satisfaçam uma grande parte da população que viu o Estado brasileiro enriquecer sem se beneficiar dessa riqueza.

O novo espaço de poder aberto pela erupção das ruas, segundo o professor Joel Formiga da Universidade de São Paulo (USP), será politicamente apropriado “por aqueles que estão mais organizados” (ZH, 23.06.2013 – p.8). A base política que apoia o governo central brasileiro tem nesse momento uma gigantesca tarefa de reagrupar, rever e reconstruir uma perspectiva diferente do que até então havia tido. Essa visão é essencial para enfrentar as dificuldades que afloram nas manifestações.

As dificuldades que os manifestantes expressam nas redes sociais devem ter a atenção imediata, embora saibamos que as soluções reais exijam um tempo bem maior do que o esperado. Para isso, partidos políticos, governos e todas as instâncias do poder republicano devem convergir. Essa ação conjunta para atingir seu objetivo pode ser ilustrada pedagogicamente da seguinte maneira:

A obesidade do estado brasileiro – representada por 39 ministérios, cargos em comissão, representações, estatais – e a falta de transparência do gasto dos ministérios com orçamentos pequenos que não resulta em ações efetivas em projetos e programas para a população.

A violência, a criminalidade, a impunidade está visível para a sociedade, assim como a ineficiência do estado brasileiro na proteção ao cidadão. O surgimento de uma PEC 37, que trazia em suas entranhas - felizmente detonada pela ágil compreensão do congresso sobre o monstro que se pretendia construir - o real afastamento do Ministério Público de promover investigação, apareceu na leitura popular como um caminho livre para a corrupção e a impunidade. 

A mobilidade urbana precária para o atendimento da nova classe média (ao redor de 100 milhões de pessoas), incorporada ao mercado de consumo por estímulo de programas sociais passou a exigir melhores meios para sustentar suas aspirações.

As obras paralisadas em vários estados – ferrovia Norte Sul, projetos de metrôs, pontes estratégicas de ligação entre municípios e regiões, Rio São Francisco, aeroportos, presídios, saneamento básico nos municípios, delegacias especializadas, projetos de irrigação agrícola, barragens, hospitais, escolas, postos de saúde, modernização tecnológica do SUS – que, ao passar do tempo, sofrem severos desgastes e, o que foi investido, termina em desperdício.

A reforma política e organização partidária, pedra de toque da representação popular e sustentação da democracia, é a mais afetada. É urgente realizar essa reforma como meio de restaurar uma adequada representação partidária e sepultar definitivamente formas corporativas de governança, que são sustentadas por troca de favores e por tempo de televisão durante as eleições.

A revisão do modelo de aposentadoria no setor público com o benefício de proventos integrais, examinando setores e carreiras que amealham valores acima dos referenciais de mercado.

Acabar com o fator previdenciário que atinge milhões de aposentados do setor privado, por se constituir em um instrumento absolutamente injusto sobre direitos daqueles que trabalharam toda uma vida para obterem um ganho digno durante a velhice.

O modelo econômico-político adotado no Brasil nas últimas duas décadas, protagonizou ganhos reais para as classes antes afastadas do consumo, principalmente quando elas angariaram melhoras para seu ambiente de moradia, mas pouco realizou quanto à acessibilidade e mobilidade urbana, cujo efeito mais visível se percebe na precária qualidade dos transportes coletivos, motivo do descontentamento geral de trabalhadores e estudantes, se constituindo no elemento impulsionador do Movimento junho 2013.

O sentimento de frustração é decorrente de promessas de campanhas políticas em que se prometem crescimento econômico superior a 6% ao ano, infraestrutura padrão FIFA, combate à corrupção, educação e saúde de primeiro mundo, a redução da criminalidade e violência e se entrega algo muito diferente, muito inferior. A situação que expõe o movimento tem de ser avaliada com cautela política e sabedoria de gestão. Desejaríamos que fosse apenas um momento de decepção passageira. E se não for? Voltará então em 2014 com que roupa e máscara?  Possivelmente com uma cobrança muito maior sobre tudo que se prometeu e, não se cumprirá, porque o que descontenta e irrita as massas não se resolve em curto prazo, nem mesmo com a mudança da nossa cultura política, esta é de longo prazo.

A pressa na interpretação desse fenômeno social repentino, pode se constituir em um equívoco na forma de preparar a configuração que se deseja dar à democracia brasileira, ou evitar o que não se deseja em termos de sistema político – a autocracia ou o nefasto legado da ditadura. Uma possibilidade para o surgimento do movimento: fechou-se o espaço político para tratar de transparência, ética e moral republicana. Aparentemente esses jovens não mais acreditam nas lideranças políticas do Congresso Nacional, na mesmice eleitoreira dos partidos políticos; não acreditam também nas promessas de campanhas políticas; não acreditam na credibilidade das explicações sobre os gastos do governo.

A outra possibilidade para o surgimento do movimento: estariam inseguros, receosos quanto à esperança de desfrutarem no futuro de um Brasil melhor e mais justo; pode ser uma antevisão – quem sabe precipitadamente conduzida – de que o sonho é passageiro, está tendo seu fim.

 

Redes sociais: o que muda em política

As redes sociais têm em sua forma de se agrupar para firmar suas bandeiras e suas causas à universalidade e a instantaneidade dos fatos. Essa forma de ação prescinde da existência de líderes ou da inserção a um partido, a um sindicato ou representação estudantil. Esse modelo de atuação – nascido na web - não pode ser interpretado como a expressão da inexistência de foco nos objetivos e nas reivindicações que levam para a rua, para as praças.

 Na verdade, as redes sociais constituem-se no contraponto dos movimentos sociais tradicionais que usam outros meios de mídia e de mobilização em suas pregações. Tergiversar sobre o tema, tentando explicar o que está visivelmente errado culpando sistemas políticos, os governos anteriores, pode ser um bom exercício intelectual, mas não motiva e nem explica aos usuários das redes o porquê da corrupção, do enfraquecimento da cidadania e da convivência pacífica e promíscua do governo federal com o capital financeiro internacional.

O Congresso Nacional pelo que representa para a democracia ainda não está em cheque, mas, pelo que representa no seu dia a dia, sim, está sendo apedrejado. Desconectou-se do povo, dos partidos e das organizações da sociedade civil organizada. Virou alvo do destrato, respingando fortemente no executivo, por deter este, poder soberano sobre as duas casas do Congresso pelo controle da maioria. Então, o que está posto para políticos, partidos e governo brasileiro é que devem estar atentos e preparados para encaminhar soluções e apresentarem instrumentos de negociação política que respondam à população as mais simples perguntas: (a) Porque a infraestrutura do país está destruída? (b) Porque a inflação está voltando? (c) Por que os projetos de interesse da população – saúde, educação, segurança, fator previdenciário - se empilham e se perpetuam nas gavetas do congresso? (d) Como resolver esses problemas, em que tempo e, com qual fonte de recursos?

Agora, frente às dificuldades políticas de negociação dos meios para atender as necessidades que explodem em discursos, cartazes e banners nas ruas, não podemos nos afastar da verdade que a distribuição de renda e os avanços sociais se deram no âmbito de um projeto político e, que, no momento apresenta certa incompetência na produção de soluções eficientes. Embora a situação como um todo requeira uma nova visão política, entende-se que é aprimorando o projeto político da sociedade brasileira é que vai se encontrar o novo caminho para o crescimento e a distribuição da riqueza. Outra forma que não seja uma melhor gestão social do que é público, não pode ser aceitável pela sociedade brasileira.