A DOUTRINA TRABALHISTA

Por: Eloí Flores da Silva

Do Movimento Autenticidade Trabalhista.

(Artigo para a Revista - ADM. ULBRA / Guaíba) Agosto de 2002

Aspectos principais da base doutrinária

 

O objeto deste artigo é de evidenciar os elementos principais que formam a base doutrinária do trabalhismo, entendido como absolutamente oportuno por estar à nação envolvida em uma das maiores eleições democráticas do mundo. O propósito primeiro é de registrar o ideário e o espírito que o inspira, de tal sorte que se possa prevenir em momento de embates eleitorais em todo o território nacional, os ataques frívolos que deformam os objetivos do trabalhismo. O segundo é de fazer incursões sobre que relação de apoio ou de intervenção se estabelece no campo econômico e político.

 

O Trabalhismo fundamenta-se em uma doutrina de interesse social e democrática que prega a liberdade, a solidariedade e a fraternidade entre as sociedades. Possui no exercício do poder legislativo e da gestão pública (no âmbito federal, estadual, municipal) experiência ímpar quanto a avanços no campo social, o crescimento e o desenvolvimento econômico, o que lhe garante importante posição no estamento político da sociedade brasileira. Protagonizou ao longo de sua existência conquistas importantes no campo do trabalho, do investimento e construção da infra-estrutura nacional, na redução das diferenças regionais, na promoção e valorização da mulher, na estabilização do sistema político e econômico e na repartição do produto social gerado por todos os brasileiros.

 

É permanente sua luta pela construção[1] (antítese da igualdade) de oportunidades econômicas e pela redução das desigualdades entre os homens. Preocupa-se com o delineamento de estratégias e soluções úteis a recuperação e integração do homem ao meio social.

 

Alberto Pasqualini, principal ideólogo do trabalhismo, servindo-se principalmente da imprensa (Correio do Povo e Diário de Notícias) escrita do Rio Grande do Sul para divulgar seu pensamento, tratou com linguagem simples de se aproximar do povo ensinando que o:

“Trabalhismo deve ser idéia, doutrina, concepção social e um sistema de soluções para os problemas correntes. Quem adere a essa idéia e a essa doutrina, é trabalhista, pouco importando suas condições intelectuais, profissionais ou sociais ou, mesmo, quais sejam os seus sentimentos pessoais em relação a este ou àquele membro do partido”.[2]

Estabelece a doutrina que o Estado Trabalhista interfira na condução dos negócios da sociedade, como forma de reduzir a ação dos detentores do poder econômico sobre os concorrentes mais fracos e sobre a apropriação dos resultados sociais que promovem os trabalhadores. Deve ainda em sua forma democrática de intervir, estimular e preparar a força de trabalho para laborar em benefício individual da família e da sociedade como um todo.

 

Na visão de Pasqualini, uma sociedade organizada de acordo com os princípios da justiça social, o acesso ao poder aquisitivo não poderia ser possível sem a realização de um trabalho socialmente útil. O lucro, dentro de certos limites, conforme sua origem e a forma de sua utilização, é legítimo. Cabe a quem coordena os fatores da produção e corre o risco empresarial, encontrar a aplicação natural no desenvolvimento da empresa e em inversões de utilidade social, a fim de criar novas fontes de riqueza e proporcionar oportunidades de trabalho.

 

Encontra-se na base doutrinária um alinhamento de ideais que conduz a um ordenamento institucional de cunho ideológico solidário, onde trabalhadores, estado e proprietários dos meios de produção são estimulados a promover o crescimento econômico, a geração de poupança e o investimento produtivo, como meta fundamental para promover o bem-estar social.

 

Mecanismos utilizados para promover o bem – estar social

Utiliza o ideário trabalhista como mecanismos acionadores do processo de desenvolvimento econômico e social e de eliminação da marginalização dos trabalhadores do campo e dos centros urbanos, políticas de solidariedade e de justiça social. Em seu espírito de solidariedade e de justiça social existem comprovadas teses sobre estratégias políticas e econômicas quanto à repartição de riqueza gerada na nação, resultando em ações inibidoras do ciclo vicioso do desemprego e da concentração de capitais gerado no interior do processo da livre concorrência.

 

Com o crescimento econômico e o desenvolvimento social propõe realizar mais do que a simples ambição individual de conquistar o bem - estar material. Busca a consciência coletiva voltada para a organização social eqüitativa e para a repartição per capita mais justa.

 

O Trabalhismo está impregnado de um ideal de justiça e fraternidade, onde a vontade humana deve predominar sobre a resultante econômica, de modo a adequá-la, orientando-a no sentido do progresso social sustentável. Acredita que a evolução de uma sociedade que se coloca como democrática é fruto da liberdade de ação do seu povo, fator estimulador da inovação, do empreendimento produtivo, do progresso técnico, intelectual e moral dos trabalhadores.

 

Em uma visão mais ampla da promoção do progresso propõe a “limitação de uso” dos recursos da produção, particularmente da empresa privada, por tê-la como principal elemento na evolução do produto social, na justa repartição da riqueza e no adequado manejo do ambiente natural. A limitação de uso não se constitui em barreira a liberdade para a organização da economia em regime de livre concorrência, ao contrário, vê nela o fator que assegura com que ocorra a melhor produção de bens e serviços e a adequada distribuição do resultado social com os trabalhadores, harmonizando interesses individuais e geral da sociedade.

 

A Doutrina Trabalhista se apóia em pontos de vistas éticos e jurídicos segundo os quais é possível construir uma sociedade orgânica livre e autodeterminada, se constituindo esta na estrutura de suporte ao desenvolvimento pleno da cidadania. Pensa que o direito de autodeterminação dos povos e das nações em seus atos de produzir, distribuir, circular e consumir bens e serviços deve ser colocado numa posição crítica frente ao comércio globalizado selvagem, principal causa de um estado econômico e social perverso aos países pobres da atualidade.

 

Controle dos mercados da globalização

O poder corporativo das transnacionais amparado pelos países ricos impôs um modelo de livre concorrência protegida aos países emergentes, e por meio deste transpôs um padrão de consumo similar aos seus mercados. Utilizando o marketing de massa e o encantamento por meio da comunicação, conseguiu desviar de maneira severa a virtude de poupar desses povos, e em seu lugar implantou um consumismo desregrado voltado para bens importados.

 

Implanta-se um modelo de produção desequilibrada em relação às necessidades essenciais desses povos, mas eficiente na produção de matérias - primas tão importantes para o processo manufatureiro daqueles. O modelo que se instala, por sua natureza e origem, provoca a injusta distribuição do produto social e a concentração de capitais, fontes de desemprego e de crescimento das desigualdades dos países emergentes.

 

O Trabalhismo interpreta que a concentração de capital e de riquezas provocadas por essa estrutura hegemônica do poder corporativo industrial internacional, não é um pilar inatacável no plano político no conserto das nações emergentes. Getúlio Vargas na Carta Testamento, documento político de grande relevo na história recente do Brasil pronuncia-se assim:

“A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. ... Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional de potencialização de nossas riquezas...”

A contestação da desigualdade que emerge do modelo hegemônico das nações ricas não significa que se prega a supressão do regime de mercado, atacar a livre concorrência. Trata-se de querer promover a transformação do meio econômico e social segundo a visão que a doutrina entende adequada a um processo de evolução equilibrada.

 

Todavia, respeitando a liberdade, sem o emprego de qualquer violência sobre o contrato social, o Trabalhismo admite a possibilidade de atuar na mudança da vontade humana sobre a evolução econômica, de modo a reformá-la dirigindo ações intervencionistas do Estado à medida que os resultados econômicos se afastem dos resultados gerais, onde se prioriza o individual, o particular.

 

A postura doutrinária é de quem procura a harmonização de um mercado de livre concorrência que se oriente por uma associação de interesses entre o Estado Trabalhista e a livre iniciativa, ambiente que não existe no estado natural, é preciso construí-lo.

 

Em termos de funcionamento do mercado e respectivas funções que deve desempenhar para promover o bem-estar do cidadão e a distribuição justa das riquezas produzidas pelo aparelho produtivo (edificações, capital, terra, trabalho, conhecimento tecnológico e mercadológico) o Trabalhismo defende a posição do associacionismo[3] de mercado, onde o espírito de concorrência de mercado, motivador do empreendimento, esteja associado ao “Espírito do Estado Solidário”, onde distribuição do produto social e formação da riqueza sejam conquistas de empreendedores e trabalhadores. Desta forma se atende os interesses estreitos existentes entre o trabalho, o capital e o consumo, modo adequado de promover o crescimento com justiça social.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

 

 

  • DUTRA, Milton. O Trabalhismo de Pasqualini. Porto Alegre : Editora Intermédio, 1986.

 

  • FIGUEIREDO, Carlos. 100 discursos históricos. Belo Horizonte : Editora Leitura, 2002.

 

  • FREIRE, Paulo. Multinacionais e trabalhadores no Brasil. 2. ed. São Paulo : Brasiliense, 1979.

 

  • HUGON, Paul. História das doutrinas econômicas. 14. ed. São Paulo : Atlas, 1980.

 

  • HUNT, E. K. História do pensamento econômico. 7. ed. Rio de Janeiro : Campus, 1989.

 

  • MELLO, Antônio Valença. Política Positiva de Augusto Comte. 1. Ed. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 1979.

 

  • RIBEIRO, Darcy. O Processo Civilizatório: estudos de antropologia da civilização: etapas da evolução sociocultural. São Paulo : Companhia das Letras, 1998.

 

  • SODRÉ, Nelson Werneck. A farsa do neoliberalismo. 3. ed. Rio de Janeiro : Graphia, 1996.

 

  • VARGAS, Getúlio Dornelles. Discursos (1903 – 1929). Org. por Carmem Aita e Gunter Axt. Porto Alegre : Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, 1977.

 

[1] A igualdade é um objetivo ideal quimérico, simples em teoria, irrealizável na política, uma vez que os homens se diferenciam, entre si, pela desigualdade de necessidades, bem como de capacidade. Com efeito, quem se incumbirá de apreciar o justo valor das necessidades dos homens, tão diferentes para cada um deles? Quem poderá dosar a “capacidade”, a força de trabalho de cada um? Como estimular o esforço de cada indivíduo para que este forneça algo superior ao esforço desenvolvido pelo menos apto? J.P. Proudhon – socialista por sua vez – observou que o homem pode amar o seu semelhante a ponto de por ele morrer, mas não a ponto de trabalhar por ele. Paul Hugon. História das Doutrinas Econômicas. 14 ed. São Paulo. Atlas, 1995.

[2] - Cf. DUTRA, Milton. O Trabalhismo de Pasqualini. ed. Porto Alegre: Intermédio, 1986. p.342.

[3] Robert Owen (1772 – 1858) nascido no país de Gales – é um dos mais originais representantes do socialismo associacionista. Foi o precursor das inumeráveis realizações de iniciativas das instituições patronais e de uma legislação trabalhista como a atualmente introduzida em todos os grandes países. Owen foi grande industrial, sendo o primeiro a colocar o problema da civilização industrial não somente no plano econômico, mas também, no plano humano. As idéias de Owen foram importantes para a iniciativa das cooperativas em 1842 em Rochedale, que gerou um surto de rápido crescimento na Inglaterra. Ler a respeito do Socialismo Espiritualista, chamado utópico, os autores Saint-Simon, Robert Owen, Charles Fourier, Augusto Comte, Louis Blanc, P.J. Proudhon. Sobre o Socialismo Marxista, dito Científico Karl Marx e Friedrich Engels. O Socialiasmo post-marxista ler Karl Kaustsky. O Intervencionismo Social do Estado (reação contra o liberalismo) de Jean Charles L. Sismonde de Sismondi.